Há semanas o concelho de
Caminha, concretamente algumas freguesias, foi assolado por um inferno de
chamas. Durante dias o toque das sirenes, o receio, o ambiente com cheiro
chamuscado e a prestação dos Bombeiros foi uma constante. Além, de uma
população atenta e prestável na ajuda aos homens que combatiam o incêndio, isto
na entrega no quartel de bens essenciais.
O Assimassim falou com Luís
Pedro Saraiva, comandante da corporação dos Bombeiros Voluntários de Caminha.
Numa entrevista onde ficamos a conhecer melhor a dedicação e empenho de homens
e mulheres no serviço para com os outros. As necessidades, exigências e objectivos
também foram abordados, e, sem esquecer, os meios necessários e a garantia que
no concelho existe um Plano de Emergência.
Assimassim (aa) -– O que representa ser comandante dos bombeiros de
Caminha?
Luís Pedro Saraiva (LPS) –
Representa muito e muita coisa. Antes de mais, é uma responsabilidade enorme
como Comandante do Corpo de Bombeiros representar uma Corporação com mais de
cento e vinte anos de história, e todos aqueles que nela deram e dão
voluntariamente todos os dias o seu melhor em prol da sociedade, e a quem todos
nós tanto devemos. Representa também uma grande responsabilidade na direcção e
administração de toda a actividade do Corpo de Bombeiros, de acordo com as
competências que a Lei me confere. Representa, para mim e para todos os Bombeiros,
muitas horas de sacrifícios pessoais, e horas e horas subtraídas ao convívio
com as nossas famílias e com os nossos amigos. Mas vale a pena, é sem dúvida um
orgulho enorme poder fazer parte deste grupo de pessoas fantásticas que sem
pedir nada em troca deixam tudo para prestar auxilio a quem dele necessita, a
qualquer hora.
Aa -Concretamente, quais as suas funções?
LPS – Concretamente
e de acordo com a Lei, o Comandante é o responsável pelo desempenho do Corpo de
Bombeiros na generalidade, e dos seus elementos em particular, no cumprimento
das missões que lhe estão legalmente atribuídas, nomeadamente na prestação de
socorro em qualquer tipo de ocorrência, transporte de acidentados e doentes,
prevenções, emissão de pareceres, acções de formação e sensibilização,
representações, etc...
Em
termos práticos ao Comandante compete o comando, direcção, administração e
organização de toda a actividade do Corpo de Bombeiros de modo a garantir a
qualidade da prestação do socorro e emergência às populações e das acções de protecção
civil.
Felizmente,
tenho um 2º Comandante e um incansável Adjunto de Comando a quem delego
competência para realizarem muitas das tarefas diárias, em quem confio
plenamente e a quem quero também deixar aqui uma palavra de reconhecimento.
Como é uma estrutura hierarquizada perfeitamente definida a cada nível cada
qual sabe as suas atribuições e a quem tem de prestar contas. Neste aspecto torna-se
mais fácil, mas já se sabe que se delegam competências, mas não se delega a
responsabilidade, que no final e em ultima análise é sempre minha.
Aa - Quantos bombeiros profissionais existem na corporação?
LPS –
Bem essa é uma questão difícil, e não queria alongar-me muito, porque há
interpretações diversas relativamente a este assunto, nomeadamente sobre a
questão de ser Bombeiro profissional ou profissional Bombeiro, ou ainda cidadão
Bombeiro voluntário que trabalha num Corpo de Bombeiros detido por uma
Associação Humanitária, sem ter de facto a profissão de Bombeiro. Mas isso é
outra conversa, que nos levaria para outros caminhos.
Em
termos práticos no meu Corpo de Bombeiros são todos Bombeiros voluntários
nenhum tem de facto a profissão de Bombeiro, penso que o quererá saber é
quantos destes trabalham a tempo inteiro e recebem salário. Neste caso são
manifestamente poucos, são apenas oito elementos assalariados, sendo que cinco
destes fazem uma escala rotativa de dois elementos afectos à guarnição do
serviço de emergência medica do INEM nas 24 horas, os outros três asseguram os
serviços restantes, principalmente o transporte de doentes não urgentes, no
período normal de trabalho.
Mas
voltando à questão do serem ou não Bombeiros profissionais, é que não podia
prosseguir sem voltar a ele, posso assegurar-lhe que os nossos voluntários em termos
de conhecimentos, formação e na actuação são reconhecidamente profissionais de
excelência muito acima da média até dos chamados profissionais em titulo.
Podemos todos estar tranquilos nesse aspecto porque temos pessoal com
capacidade técnica, dedicação e profissionalismo extremo.
Aa - Quantos voluntários?
LPS –
Atendendo ao que lhe disse anteriormente, somos todos voluntários, embora os
tais oito de que lhe falei sejam remunerados. Neste momento entre o Quadro activo
e o Quadro de Comando somos no total de 39 elementos. Resumindo: três fazem
parte do Quadro de Comando, o Comandante, o 2º Comandante e o Adjunto de
Comando, e os restantes fazem parte do Quadro activo, dos quais oito trabalham
no Corpo de Bombeiros a tempo inteiro.
- Aa – Entre eles existem mulheres? Como são vistas num meio
essencialmente de homens?
LPS –
Sabe , nós entre Bombeiros não vemos as coisas dessa forma e não há na prática
distinção devido ao género. São todos tratados do mesmo modo, todos têm os
mesmos direitos e os mesmos deveres e também as mesmas oportunidades. Não há
aqui qualquer tipo de discriminação, no entanto os Bombeiros homens são também
uns cavalheiros e há certas tarefas em que, até por questões físicas, são eles
que se chegam à frente, noutras são mais “elas”. Nunca dei nenhuma indicação
para tratamento diferenciado pelo facto de serem mulheres ou homens, excepto nas
camaratas que são separadas, claro.
O que eu
sinto é que há um ambiente muito saudável entre todos os Bombeiros, “eles” e
“elas”, com respeito mutuo, uma convivência e partilha muito positiva e isso é
fantástico. O melhor exemplo que lhe posso dar é que temos casos em que marido
e mulher são Bombeiros.
Neste
momento temos cinco mulheres no Quadro activo , ou seja mais de 10%, já tivemos
mais mas também já tivemos menos. Sinceramente não é um assunto que me preocupe
muito por agora. A vida é assim, temos de aceitar que infelizmente a partir de
uma certa idade seja mais difícil para uma mulher conseguir conciliar a vida
familiar com as suas obrigações no Corpo de Bombeiros. E o caso dos homens é
semelhante.
Claro
que gastava de poder contar mais mulheres, mas estamos acima da média do que se
passa noutros Corpos de Bombeiros e isso já me deixa um pouco mais satisfeito.
Fica aqui o apelo às mulheres para que se inscrevam neste Corpo de Bombeiros.
- Aa – A corporação necessita de mais homens?
LPS –
Sem dúvida, precisa de mais homens e de mais mulheres. Como lhe disse, as
obrigações para com o Corpo de Bombeiros começam a ser difíceis de
compatibilizar com a vida familiar, principalmente para quem tem filhos
pequenos. Por isso precisamos de mais pessoal para que se possa fazer uma maior
rotação de pessoal entre serviços. Temos um quadro de pessoal homologado com
capacidade para 77 elementos, portanto neste momento temos cerca de 50% do
pessoal previsto.
Aproveito
esta oportunidade para fazer um apelo a todos aqueles, e já agora a todas
aquelas, que tem entre 18 e 45 anos se juntem a nós, inscrevendo-se para a
formação inicial de Bombeiro, abraçando uma causa nobre e que será certamente
um motivo de orgulho.
- Aa- Que está a ser feito no sentido da formação?
LPS –
Para mim este foi sempre um ponto chave e o meu primeiro objectivo desde que
iniciei o cargo de Comandante em 2006. Desde essa altura para cá muito mudou
nos Bombeiros, quer na minha Corporação quer nos Bombeiros em geral. Dantes a
formação era uma miragem e estava apenas disponível para alguns. Mas era
assim. Eram essas as regras, mesmo a
nível interno.
Confrontado
com isto, tomei como prioridade e desígnio para o meu Corpo de Bombeiros a
formação e valorização do pessoal, quer através da formação quer através da
progressão na carreira.
Logo no
início realizou-se uma Escola de Bombeiros com a formação inicial que na altura
era de 350 horas, e com a entrada de novos elementos. Foram feitas acções de
formação a todos os níveis para todo o pessoal, sem excepção.
De
seguida tratamos abrir concurso para promoção a Bombeiros de 2ª classe dos
Bombeiros de 3ª classe que não eram promovidos há mais de cinco anos.
Continuamos com este espirito e conseguimos que todos os elementos fizessem
recertificação em Técnicas de Socorrismo e em Salvamento e desencarceramento.
Fizemos
o provimento de mais dois elementos na carreira de Oficial Bombeiro, que é uma
carreira para Bombeiros que possuem um grau académico universitário, e ainda
este ano vamos abrir concurso para que possam ser promovidos.
No ano
passado, fizemos a abertura de concurso para promoção a Bombeiro de 1ª Classe e
a Bombeiro de 2ª Classe, onde foram promovidos sete e treze Bombeiros respectivamente
.
Até ao
fim desta comissão de serviço, que termina daqui a menos de um ano, tenho como objectivo
fazer mais uma Escola de Bombeiros e assim aumentar o número de efectivos pelo
menos em 25%.
Nos
últimos quatro anos houve dezenas de formações e treinos operacionais a todos os
níveis e em várias matérias em que participou a generalidade do pessoal. Hoje
ninguém se pode queixar de falta de formação. Nesse aspecto, estou muito
satisfeito com aquilo que conseguimos alcançar e ao nível a que chegamos.
Estamos entre os melhores.
Aa- Essa formação existe com regularidade na corporação de Caminha?
LPS –
Posso -lhe dizer que hoje em dia só não faz formação quem não quiser ou não
tiver disponibilidade, porque há imensas oportunidades para frequentar cursos, acções
de formação, treinos operacionais conjuntos com outros Corpos de Bombeiros,
etc.. Porque os cursos existem e tem havido bastantes vagas, talvez não as
necessárias, mas as suficientes e as possíveis. E isto a todos os níveis, desde
o Comandante até ao Bombeiro mais novo e menos graduado da Corporação, a
formação está disponível para todos.
Neste aspecto,
tem havido um grande interesse e disponibilidade e até sacrifício do pessoal
para frequentar formações, que muitas vezes são até fora do distrito, e todos
os Bombeiros tem feito muitas horas de formação e treino, principalmente nos
quatro últimos anos.
Para
além das formações promovidas pelas entidades oficiais e acreditadas para dar
formação aos Bombeiros, a Escola Nacional de Bombeiros, a ANPC, e o INEM, há
ainda a instrução interna do Corpo de Bombeiros onde todos os Bombeiros são
obrigados a fazer pelo menos 40 horas de formação.
Aa - Basicamente em que consiste a mesma?
LPS – A
formação dos Bombeiros está regulamentada pelo Despacho nº 9920/2015 que define
o Regulamento dos Cursos de Formação, de Ingresso e de Acesso à Carreira de
Bombeiro Voluntário. Está lá tudo, todos os cursos e a quem se destinam e em
que fases da carreira, um verdadeiro tratado a todos os níveis.
Antes de
mais, para se ser Bombeiro é necessário fazer a formação de ingresso na
carreira num total de 250 horas. Nesta formação são fornecidos conhecimentos
sobre o modo de funcionamento dos Bombeiros, sobre veículos e os seus
equipamentos, sobre extinção de incêndios urbanos e florestais, bem como o
curso de primeiros socorros e curso de salvamento e desencarceramento, com 50
horas cada. Estes últimos são ministrados pela Escola Nacional de Bombeiros
onde há exames e notas, e o candidato a Bombeiro é considerado apto ou não
apto. A somar a isto há um período provatório de estágio de com duração mínima
de três meses.
Depois
há ainda que distinguir a formação externa e a formação interna. A formação
externa é ministrada, como lhe disse há pouco, por entidades acreditadas para
esse efeito e igual para todos os Bombeiros do país. Da formação externa, por
assim dizer, há a chamada formação de aperfeiçoamento técnico que é feita
regularmente ao longo da carreira. Esta formação está organizada de forma
modular e por níveis, sendo que algumas têm precedências.
As
formações são compostas geralmente por uma componente teórica e por uma
componente prática, com carga horária mínima de 25 ou 50 horas. Há formações
que são obrigatórias e outras que são facultativas, mas em todas há exames e
notas. Por exemplo, a formação para ser tripulante de ambulância de socorro é
obrigatória e tem uma duração de 210 horas ministradas pelo INEM. Escusado será
dizer estas formações têm validade e é necessário fazer recertificações
periodicamente.
A
formação interna, as instruções, para além de sessões teóricas, esta formação
consiste basicamente em treino e aplicação de conhecimentos a situações
simuladas, para que quando confrontados com situações reais alguns
procedimentos estejam mecanizados e sejam executados com rapidez e segurança.
Dou-lhe como exemplo o conhecimento dos veículos e dos equipamentos que deles
fazem parte bem como o seu correto manuseamento que é fundamental, assim como
deve ser verificado e testado com regularidade por todos os Bombeiros.
Como vê
a formação e treino dos Bombeiros é permanente e exigente, o que obriga também
a uma grande disponibilidade e motivação do pessoal em manter-se actualizado.
Aa - Qualquer cidadão pode ser bombeiro, quer profissional ou
voluntário?
LPS – Em
principio sim, qualquer pessoa com idade entre os 18 e os 45 anos pode
ingressar nos bombeiros. Desde que frequente a tal formação de ingresso na
carreira, que seja aprovado, e logo que seja considerado apto após o estágio
passa a ser Bombeiro de 3ª Classe.
Há
questões que são condicionantes como por exemplo a escolaridade mínima, que
para os nascidos antes de 1 de Setembro de 1997 a escolaridade obrigatória é o
9.º ano, e da capacidade física que tem de ser comprovada por atestado médico.
Mas ser
Bombeiro não é uma questão de “poder ser”, é mais uma questão de “querer ser”.
É necessário querer mesmo ser Bombeiro porque é necessário muito empenho,
dedicação e disponibilidade. Mas a experiência compensa.
Aa -Em caso de incêndio quando ou em que circunstância se apela aos
voluntários?
LPS –
Sempre, e não é só em caso de incêndio. Como lhe disse há pouco, esta
Corporação tem apenas cerca de 10% de pessoal assalariado, que assegura a
primeira linha do serviço de emergência médica e o transporte de doentes não
urgentes, pelo que muitos dos serviços são realizados pelo pessoal não
assalariado, os tais chamados de voluntários.
É claro
que numa situação de incêndio geralmente é necessário contar com um número
considerável de Bombeiros e por isso todos são chamados a intervir, quer pelo
toque da sirene quer por contacto telefónico. Claro que em determinadas horas
do dia uns têm mais disponibilidade de que outros. É a vida!
Os
piquetes nocturnos, as prevenções em espectáculos e eventos, outros serviços
não urgentes, e muitos transportes de doentes, são assegurados por pessoal não
assalariado. E em certas situações sem esse pessoal era completamente
impossível garantir até o próprio socorro.
Posso
dar-lhe o exemplo deste ultimo grande incêndio em que todos os Bombeiros desta
Corporação estiveram envolvidos, uns com mais horas outros com menos, mas todos
deram o seu contributo, e não foi coisa pouca. Muitos deixaram os seus
trabalhos durante dias, com prejuízos pessoais, para estar envolvidos nas acções
de combate ou naquilo que era preciso no momento em prol da população. É um
facto que tem de ser enaltecido e valorizado.
Aa - Nos últimos tempos tem havido um recuo no voluntariado?
LPS –
Nos últimos anos as exigências quer para ser Bombeiro quer para se manter nos
Quadros tem aumentado, como é o caso do número de horas de formação
necessárias, do número mínimo de horas obrigatórias de piquete e de instrução,
o aumento dos serviços de prevenção a eventos nos fins de semana, etc.
O
sistema de incentivos ao voluntariado nos Bombeiros também não ajuda muito a
que as pessoas sintam apoio pela disponibilidade a que se dispõem. Mas penso
que não será por isso que há menos pessoas a voluntariar-se para ser Bombeiros
ou a disponibilizar menos tempo de serviço voluntário.
Por
outro lado, penso que a situação económica e financeira a que o país chegou, e
em que nos encontramos, também leva a que as pessoas tenham tendência a ocupar
os seus tempos livres com trabalhos remunerados, deixando menos tempo
disponível para o voluntariado. E isto tem-se sentido nesta Corporação.
Aa - Nesse sentido, não deverá existir, campanhas de
sensibilização junto da comunidade? Elas existem? Em que moldes?
LPS –
Penso que a comunidade está muito sensibilizada para a causa dos Bombeiros e
isso viu-se pela forma como se solidarizaram no apoio com agua, comida, fruta,
bolachas etc, que foram entregando no Quartel durante este ultimo incêndio.
Aproveito a oportunidade para agradecer todo o apoio quer material quer humano
e incentivo que foi dado pela população aos nossos Bombeiros. Foi realmente
fantástico.
Mas
voltando ao assunto, estamos neste momento numa acção de recrutamento de
elementos para formação de uma Escola de novos Bombeiros. Já estão na rua
cartazes e telas com informações para inscrição e estamos a trabalhar nesse
sentido junto das paróquias, juntas de freguesia, escolas, e outras
instituições. Queremos envolver toda a comunidade nesta acção tão importante e
tão necessária para aumentar o número de Bombeiros desta Corporação.
Aa - Em caso de incêndio, quando e em que circunstâncias se opta
por solicitar o auxílio do comando distrital ou nacional?
LPS –
Penso que se está a referir ao caso dos incêndios florestais, e que há neste aspecto
alguma falta de informação e de conhecimento da orgânica e do funcionamento do
chamado DECIF, Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Florestais, o que
leva a algumas confusões. Todos os anos há um despacho do Ministério da
Administração Interna que faz a homologação da directiva Operacional Nacional
nº2, que estabelece o DECIF para esse ano e como ele se articula.
É a ANPC
a través do Comando Distrital de Operações de Socorro, CDOS, na pessoa do
Comandante Distrital que, no período de vigência do DECIF, assegurar a
cooperação institucional e coordenação operacional, a nível distrital e
municipal. Isto é, faz a coordenação dos meios.
Portanto
quando há um incêndio em qualquer ponto do distrito o Comando Distrital
coordena os meios dos Corpos de Bombeiros afectos ao DECIF, e em principio os
mais próximos, de modo a que seja dada uma pronta resposta. Para que entenda,
dou-lhe um exemplo: perante um incêndio em Caminha, em principio na fase
inicial, o CDOS acciona para o local os meios dos Bombeiros de Caminha, de V.P
de Âncora e de VN de Cerveira.
Outra
coisa é o Comando das operações, que se desenvolve de uma forma modular e
evolutiva conforme a quantidade de meios envolvidos e compete, até determinado
nível, ao Bombeiro mais graduado no teatro de operações. A partir de uma certa
dimensão dos meios envolvidos na operação esta tem de ser comandada pelo
Comandante do Corpo de Bombeiros. Chegada a uma determinada fase, quer pela
quantidade de meios, natureza ou extensão e quantidade de meios envolvidos
compete á ANPC assegurar o controlo da operação. Isto é a Lei, é assim.
Mas isto
é na teoria, porque a directiva implicitamente permite à ANPC avocar o Comando
da Operação em qualquer circunstância. Geralmente isto acontece nos casos de
operações mais mediáticas ou politicamente mediatizadas. Este ano por acaso não
os vi tão activos nas televisões, nem sei porquê.
Aa -Recentemente, o concelho de Caminha foi vítima de um enorme
incêndio. Os meios foram os suficientes? Visto que as chamas se alargaram por
várias freguesias …
LPS –
Perante as circunstâncias em que o incêndio deflagrou, temperatura acima dos 30
graus, humidade relativa abaixo dos 30%, velocidade do vento superior 30 km/h
com rajadas, e com o relevo e vegetação em causa, os meios quer do concelho,
quer do distrito nunca seriam suficientes. Principalmente na fase inicial do
incêndio os meios disponíveis revelaram-se manifestamente escassos face à
dimensão que rapidamente este tomou.
Repare-se
que o incêndio teve inicio por volta das cinco e meia da tarde e às oito e meia
da noite, e após vários pedidos de equipas de reforço, ainda só estavam a
combate-lo cerca de 35 Bombeiros, com frentes activas com quilómetros de
extensão. Nessa noite protegeram-se principalmente as casas que era a primeira
prioridade, e que se conseguiu com os meios disponíveis. Foi um trabalho
fantástico, mesmo com a extensão do incêndio e com a quantidade de
reacendimentos que se verificavam a toda a hora. E não foram só os Bombeiros, foram
também muitos populares que deitaram a mão como podiam para ajudar. E assim é
que deve ser.
Em
termos florestais houve perdas enormes e que levarão anos a ser reparadas.
Houve situações muito complicadas junto de habitações que felizmente foram
resolvidas sem grandes danos ou perdas avultadas, embora por precaução se
tivesse procedido a evacuações de algumas casas devido ao fumo, mas ninguém
ficou desalojado.
É
preciso analisar o assunto friamente e sem paixões e ter em conta que nessa
semana, e na semana anterior, houve uma enorme quantidade de ocorrências em
condições muito difíceis quer por todo o distrito quer no país inteiro. Há que
reconhecer que não havia Bombeiros para tantos incêndios, e parte dos que havia
estavam já exaustos de uma semana intensa de muito trabalho e com pequenos
períodos de descanso.
Atendendo
às circunstâncias e à dimensão deste incêndio acho que podemos dizer que no
final o resultado foi muito positivo, atendendo a que não houve feridos graves
a lamentar ou perdas materiais avultadas.
Aa -Qual a área ardida neste último incêndio?
LPS – A indicação
que tenho do levantamento preliminar feito pelo Gabinete Técnico Florestal da Câmara
Municipal de Caminha é que serão cerca de 1700 hectares de área ardida, entre
pinhal, eucaliptal, pequenas explorações agrícolas, mato, terrenos incultos,
etc.
Aa -Existiram críticas no que aos caminhos florestais diz respeito,
considerando a população não estarem nas devidas condições para a passagem das
viaturas dos bombeiros e no seu trabalho. Qual a situação do concelho neste
assunto?
LPS – Na
generalidade os caminhos florestais estão minimamente transitáveis, tendo sido
beneficiados principalmente os estradões onde passa o rali, o que veio permitir
que se atravesse quase o conselho inteiro pelo meio do espaço florestal desde
Dem até Riba de Âncora rapidamente e em condições excelentes. Claro que há
sempre espaço para se melhorar e é um trabalho que pode e deve ser feito,
principalmente no que diz respeito aos particulares.
Aa -Por vezes, é o homem o incendiário e, por outras, existe uma
falta de manutenção dos caminhos ou até mesmo junto das residências. Os
proprietários são sensibilizados para a manutenção da área que lhes compete?
LPS –
Esse é um assunto complexo e não parece fácil de resolver, até porque há muitas
propriedades ao abandono sem qualquer cuidado ou cultivo. Isto acontece não só
nos espaços florestais, mas também no meio de aglomerados populacionais. Muitas
pessoas não fazem sequer a limpeza dos seus próprios terrenos junto das suas
habitações.
Felizmente
há muitos casos em que é feita a limpeza como a Lei prevê, mas ainda á muito
que fazer nessa matéria em termos de sensibilização e educação dos
proprietários. Muitos, há boa maneira portuguesa, só se lembraram de fazer
alguma coisa depois deste grande incêndio.
Aa -Existem coimas para quem não cumpra estas normas?
LPS –
Sim, a Lei prevê entre outros aspectos coimas para quem não proceda à limpeza
dos seus prédios,
Aa - Em caso de incêndio, quando podemos considerar que estamos
presentes perante uma emergência ou catástrofe?
LPS – A Lei
de Bases da Protecção Civil , a Lei n.º 27/2006, de 3 de Julho, com as recentes
alterações, define aquilo que se chama de acidente grave ou catástrofe, e que
de uma forma muito generalista lhe vou tentar explicar, tem a ver com a
dimensão da ocorrência, com a limitação no tempo e no espaço, com a forma como afecta
o modo de vida das pessoas e os seus bens, com o número de vítimas e seu estado
e com os prejuízos que causou ou pode causar.
Em termos teóricos pode considerar-se que quase
todos incêndios são é uma emergência, uma vez que se associa a emergência a
qualquer processo que possui capacidade de alteração das condições normalmente
estabelecidas, obrigando a tomada de medidas extraordinárias.
Para um
incêndio se considerado uma catástrofe seria de uma gravidade tal suscetível de
provocar elevados prejuízos materiais e, eventualmente, vítimas, afectando intensamente
as condições de vida e o tecido socioeconómico em áreas ou na totalidade do
território nacional.
Aa -Existe em Caminha um Plano de Emergência?
LPS – Sim, o município de
Caminha tem um plano de emergência municipal.
Aa -Em que consiste?
LPS – Um Plano de Emergência é uma ferramenta
de gestão que define um conjunto de regras e procedimentos quer para a sua activação
quer para a execução perante aquilo que se considera uma ocorrência grave ou
catástrofe ou na sua eminência. Deve ser apenas ativado em situações que pela
sua dimensão e gravidade justifiquem o accionamento de meios públicos e
privados para fazer face às situações de emergência.
Basicamente
quando o Plano é ativado é transferida para a competência da Comissão Municipal
de Protecção Civil, entre outras, a gestão e coordenação de determinada
ocorrência, nomeadamente as estruturas e órgãos de coordenação e comando.
Aa -Algumas artérias de Caminha tiveram alterações no último
incêndio. Houve algumas críticas à forma como elas foram impostas. Como
comandante da corporação dos Bombeiros de Caminha que comentário lhe merece?
LPS –
Penso que se refere ao facto de ter sido condicionado o trânsito na Rua Lino
Felgueiras da Silva, que é rua onde se situa o Quartel dos Bombeiros. Não tinha
conhecimento dessa interpretação, mas acredito que assim seja, há gente para
tudo.
Bem, o
que lhe posso dizer sobre isso é que me parece que se tratou apenas de uma
questão de bom senso. Repare, no próprio dia, mas principalmente nos dois dias
seguintes a este grande incêndio, havia uma grande movimentação de meios na rua
com carros de Bombeiros e ambulâncias a entrar e a sair, movimento este que
estava a ser incompatível com o trânsito normal nessa rua.
A somar
a isto há que ter em conta que estamos no mês de agosto, com um aumento
significativo do trânsito automóvel na vila de Caminha. Acresce ainda a
quantidade de pessoas que num movimento de solidariedade sem precedentes vinham
de carro e queriam entregar donativos ou apena felicitar os Bombeiros pelo seu
trabalho. Chegou-se a um ponto em que nem os carros de Bombeiros conseguiam
transitar ou mesmo entrar no Quartel, por isso pareceu-me sensato que se
procedesse ao desvio do trânsito vindo do centro para outra rua.
Parece-me
de um egoísmo e falta de sensibilidade extrema quando há pessoas e habitações
em risco e se vem fazer observações a quem está a trabalhar no sentido de
resolver o problema só porque lhes causa transtorno fazer um desvio de 250
metros de carro. Não compreendo.
Aa - Para terminar, que palavras gostaria de deixar aos bombeiros
de Caminha e a população?
LPS –
Aos Bombeiros não preciso de dizer muito, todos conhecem o meu sentimento,
respeito, admiração e confiança no seu trabalho. Deixo, pois, a todos e a cada
um em particular, uma palavra de reconhecimento pelo seu empenho que é por
demais devida, quer por mim quer por toda a população.
Resta-me,
em meu nome pessoal e em nome da Corporação que represento, um sentido
agradecimento e profundo reconhecimento pela forma como a população se
sensibilizou pela causa dos Bombeiros e pelas manifestações de solidariedade
que temos vindo a receber, e reafirmar que no que respeita a esta Corporação
podem estar confiantes e tranquilos porque os Bombeiros estarão sempre
presentes e disponíveis.
Sem comentários:
Enviar um comentário